A resposta elétrica apresentada no interior dos vasos sanguíneos poderia ser controlada externamente, em terapias não-invasivas, para combater doenças cardiovasculares. [Imagem: Jiangyu Li et al.]
Cientistas e engenheiros vêm trabalhando com afinco na interligação entre as funções biológicas dos seres vivos e os computadores.
Embora máquinas controladas pelo pensamento pareçam ser uma alternativa mais promissora, sobretudo para as próteses biônicas, na maioria dos casos é necessário usar eletrodos como interface entre o biológico e o eletrônico.
Mas talvez não seja mais necessário.
Isto porque os tecidos vivos, mais especificamente, as paredes da aorta dos mamíferos, têm não apenas uma propriedade elétrica, mas uma propriedade ferroelétrica.
A ferroeletricidade consiste em uma resposta a um campo elétrico, enquanto o ferromagnetismo consiste em uma resposta a um campo magnético.
Ela é apresentada por uma molécula eletricamente polar, ou seja, uma molécula com uma extremidade com carga positiva e outra com carga negativa. Essa polaridade pode ser invertida submetendo-a um campo elétrico.
Bioeletricidade
A descoberta surpreendente foi feita por engenheiros da Universidade de Washington, nos Estados Unidos.
"O resultado é entusiasmante por razões científicas. Mas ele também pode ter implicações biomédicas," afirma cauteloso o Dr. Jiangyu Li, líder da equipe.
A ferroeletricidade é bem conhecida em materiais sintéticos e inorgânicos, uma propriedade que é largamente explorada em memórias para computadores, sistemas de armazenamento de dados, sensores e telas.
Apenas no ano passado surgiu o primeiro indício da existência de ferroeletricidade em tecidos vivos, encontrada em moluscos marinhos. Agora o fenômeno foi localizado na aorta de um mamífero - um porco.
A ferroeletricidade biológica parece estar associada com a elastina, um colágeno fibroso que dá elasticidade às veias e artérias.
O gráfico em formato de borboleta é a demonstração clássica da resposta ferroelétrica. [Imagem: Y. M. Liu et al.;/Alan Stonebraker]
Novos estudos deverão elucidar que papel a propriedade ferroelétrica exerce no interior do tecido biológico, embora os cientistas já estejam especulando que ela pode ser importante na resposta do corpo aos açúcares e à gordura.
O diabetes, por exemplo, é um fator de risco para o endurecimento das artérias, ou arteriosclerose, que pode levar a ataques cardíacos ou derrames.
A equipe planeja agora investigar as interações entre a ferroeletricidade e as moléculas de glucose, eletricamente carregadas, na esperança de entender melhor os efeitos do açúcar sobre as propriedades mecânicas das paredes das veias e das artérias.
"Estamos imaginando se poderemos manipular a polaridade das paredes das artérias. Então poderemos, por exemplo, entender melhor a deposição de colesterol, que leva à diminuição do fluxo sanguíneo," disse o Dr. Li.
Mas ele alerta que as aplicações médicas ainda vão demorar. "Há muitas questões a serem respondidas, e este é um aspecto entusiasmante desse trabalho," afirmou.
Possibilidades
De fato, há muito mais a ser pesquisado.
Por exemplo, os materiais ferroelétricos normalmente também são piezoelétricos e piroelétricos, ou seja, sua polarização pode ser invertida por forças mecânicas ou por uma alteração de temperatura.
Tamanha versatilidade tem colocado esses materiais em áreas tão diferentes quanto os equipamentos de ultra-som e as câmeras infravermelhas.
Mas também há aplicações em tecnologias mais avançadas, incluindo os nanogeradores e as geladeiras de estado sólido.
Será que essa propriedade elétrica natural, presente nos tecidos biológicos, poderá abrir caminho para manipulações internas, seja por micro ou nano-robôs, ou mesmo externas, em terapias eletromagnéticas não-invasivas?
Como o Dr. Li salienta, é necessário cautela, mas as possibilidades são entusiasmantes.
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