Há pouco mais de um ano, um dos maiores projetos aprovados no site de
crowdfunding Kickstarter dominava as manchetes de todos os sites de
tecnologia: haviam inventado uma caneta que desenhava no ar,
e a campanha para esta pequena prodígio se tornar realidade quebrara
todas as expectativas. Em apenas 30 dias de exposição do projeto, a
arrecadação da 3Doodler, a primeira caneta 3D da história, ultrapassou
seus US$ 30 mil de meta e foi até os US$ 2.344.134 (cerca de R$ 5 milhões).
A embalagem da 3Doodler vem com muitos refis coloridos, além da caneta (Foto: Renato Bazan/TechTudo)
O
TechTudo teve a chance de botar as mãos nessa nova ferramenta e podemos
dizer sem dúvida: esse objeto criado pela WobbleWorks pouco tem a ver
com uma caneta. Mesmo que seu formato lembre, de longe, aquele de um
adereço para escrita, a semelhança termina aí - a 3Doodler é muito mais.
Desenhando com plástico
A
3Doodler, fielmente descrita, é mais semelhante a uma impressora 3D do
que qualquer objeto do dia a dia. O processo de impressão é exatamente o
mesmo, aliás: através de um sistema de superaquecimento e subsequente
extrusão de um filete de plástico que brevemente se solidifica.
Uma
ponta metálica em constante superaquecimento vai ocupando posições no
ar e deixando seu rastro de plástico. A diferença é que, ao invés de uma
estrutura de trilhos que leva a ponta da ferramenta de impressão para
coordenadas específicas, existe a mão do usuário.
Tipo de plástico
Ela
pode usar plásticos do tipo ABS e PLA, como a maioria das impressoras
3D domésticas, e emite o mesmíssimo aroma peculiar de borracha queimada
durante o trabalho. O uso de PLA, no entanto, tem que ser feito com
cautela: sua composição química é altamente reativa com o papel, e não
se desgrudará com facilidade se o usuário trabalhar sobre o jornal ou
algo do gênero.
Duas velocidades
A
caneta conta com duas velocidades diferentes, teoricamente pensadas uma
para os traços longos e outras para os trabalhos de precisão. No
entanto, há uma limitação grave: quando acionada em sua variação mais
veloz, o fluxo inconstante do fio plástico impossibilita a precisão nas
formas.
A gravidade é a principal vilã, sempre. Pois distorce
os fios para baixo assim que eles deixam a ponta. Por causa disso, é
quase impossível orientar o traçado em curvas – para tal, faz-se
obrigatório um suporte no formato curvilíneo desejado, para que o fio de
plástico possa contorná-lo até que solidifique.
Construir as formas em três dimensões exige raciocínio e planejamento (Foto: Renato Bazan/TechTudo)
Todo
o processo criativo lembra o trabalho de um engenheiro, mais preocupado
com a viabilidade estrutural das formas: traços verticais precisam ser
apoiados pelo desenhista até que enrijeçam, formas suspensas precisam de
pilares e a economia de traços é essencial para que nada desabe
sozinho.
Tecnologia de anteontem
Fora
os desafios inerentes ao uso de filetes de plástico, a própria
construção da 3Doodler não ajuda muito na criatividade do usuário. Cada
refil é pequeno demais, e a troca atrapalha em muito o andamento e
criação de peças longas que precisam de mais de uma carga. A troca de
cores, então, é uma grande dor de cabeça. O refil não pode ser removido
quando está perto do fim, é preciso gastar tudo e esperar que a caneta
encontre o novo fio para continuar. Uma bagunça.
O tipo de
processamento do plástico escolhido para o processo de extrusão, via
calor, cobra seu preço. É preciso tomar muito cuidado ao manusear a
caneta, pois sua ponta fica muito quente durante o derretimento do
plástico. Um toque de leve pode ser suficiente para provocar uma
queimadura superficial, e isso vai acontecer – muitas vezes –, será
preciso interromper o caminho do plástico perto da ponta, como forma de
voltar atrás no traço e continuar o desenho.
Forma e peso
Nem
tudo é ruim, felizmente. É preciso reconhecer: apesar de ter um corpo
muito largo para o que se pretende ser uma caneta, seu peso é
relativamente leve, e seu formato tem uma pegada boa, que afasta o calor
da queima de plástico das áreas de contato. O plástico rígido e os
botões emborrachados no centro da 3Doodler parecem bastante resistentes
ao manuseio, e a decisão de deixar o fio elétrico na ponta oposta à da
saída do plástico tem um efeito estabilizador sobre a movimentação.
O papagaio apoiado nesta torre foi feito exclusivamente pelo uso da 3Doodler (Foto: Renato Bazan/TechTudo)
Primeiros traços
Não
seria justo julgar por uma experiência tão curta a real funcionalidade
de um objeto tão incomum, mas é possível afirmar: o primeiro contato com
uma caneta 3D é menos do que amigável. Quem quer que vá esperando algo
como um lápis mágico terá uma sincera decepção, pois há um longo
aprendizado até que o usuário consiga dominar a 3Doodler e produzir belezas como a da foto acima. Será preciso algum conhecimento e muita "tentativa e erro" até lá.
A
tecnologia, afinal, há pouco nem existia. Nem mesmo a 3Doodler chegou,
uma variação mais avançada já tomou as manchetes em maio: a caneta 3D Lix Pen, prospectada para chegar ao mercado em janeiro de 2015.
Além de realmente parecer uma caneta no seu formato e manter um fluxo
de plástico melhor, sua ponta não é aquecida – ao invés disso, a caneta
usa um material reativo à luz para solidificar o traçado tridimensional.
Vale
reforçar o que disse Ricardo Cavallini, sócio da Makers do Brasil –
empresa entusiasta que trouxe e exibiu a caneta 3D no youPix – ao
TechTudo: “A 3Doodler tem muito mais a ver com o exercício da
criatividade do que com precisão artística. Ainda não há condições para a
criação da perfeita caneta 3D”.
Onde encontrar
Quem se interessou pela 3Doodler pode visitar a página do Kickstarted para conhecer o início do projeto. Encomendar uma caneta 3D com 50 cargas de cores por US$ 99 no site oficial - o refil de cada carga custa US$ 9,99. Há ainda um canal no YouTube com o passo a passo da impressões.